Escalada de taxação pesa contra bolsas

Wall Street registra quedas fortes e S&P 500 entra brevemente em “bear market”; Ibovespa recua 1,32% e Vale perde R$ 34,5 bilhões em valor de mercado

Por Maria Fernanda Salinet, Bruna Furlani, Artur Scaff, Cristiana Euclydes e Luana Reis — De São Paulo

O alívio inicial nos mercados diante da possibilidade de avanços em acordos bilaterais entre Estados Unidos e China deu lugar a um clima de tensão ao longo do pregão de ontem. Com o fim do prazo estipulado por Washington para que o gigante asiático recuasse de suas tarifas retaliatórias, o presidente americano, Donald Trump, anunciou que irá impor taxação de 104% sobre os produtos chineses. O acirramento dos conflitos comerciais provocou uma forte aversão ao risco, pressionando fortemente as bolsas globais e reacendeu preocupações em torno de uma recessão mundial.

Em Wall Street, o índice Dow Jones recuou 0,84%, fechando aos 37.645,59 pontos. Já o S&P 500 caiu 1,57%, para 4.982,77 pontos, e chegou a entrar brevemente em “bear market” – quando a queda atinge 20% em relação ao pico mais recente. Todos os setores do S&P 500 terminaram o dia no negativo, com materiais (-2,96%) e consumo discricionário (-2,54%) liderando as perdas. Já o Nasdaq registrou a maior desvalorização, ao recuar 2,15% e fechar aos 15.267,91 pontos.

Os investidores começaram o dia com certo otimismo, impulsionados pelos preços baixos dos ativos e pela expectativa de avanços nas negociações entre Estados Unidos e Japão. No entanto, conforme se aproximava o fim do prazo para que a China recuasse de suas tarifas retaliatórias, os temores de uma escalada nos conflitos comerciais ganharam força e pressionaram as ações para baixo.

Entre os destaques negativos do dia, as empresas chinesas listadas em Nova York sofreram fortes quedas. Os ADRs (recibos de ações) da PDD Holdings, por exemplo, recuaram 6,03%. O setor de tecnologia também foi duramente impactado pelo estresse no mercado: as ações da Tesla caíram 4,9%, enquanto os papéis da Apple cederam 4,98%.

A escalada da guerra comercial também atingiu o Ibovespa, que recuou 1,32%, aos 123.932 pontos, pressionado por papéis de commodities. As ações da Vale caíram 5,48%, devido à desvalorização do yuan promovida pelo governo chinês na tentativa de compensar a perda de competitividade provocada pelas tarifas impostas pelos EUA. No entanto, a queda do yuan também reduz o poder de compra da China, o que levanta dúvidas sobre a demanda futura por minério de ferro e intensifica o pessimismo em relação à Vale. Desde o anúncio do “tarifaço” na última quarta-feira, a mineradora já perdeu R$ 34,5 bilhões em valor de mercado e atualmente está avaliada em R$ 223,9 bilhões.

O diretor de investimentos da Nau Capital, Maurício Valadares, afirma que a depreciação do yuan em relação ao dólar tem efeito direto sobre
commodities e empresas que trabalham com matérias-primas.

“Uma China enfraquecida, que é basicamente a maior consumidora de commodities do globo, gera um efeito para baixo em ações como a da Vale, já que a China é a maior importadora de minério de ferro do
mundo”, aponta

A falta de visibilidade dos mercados impulsionada pela postura de Trump criou um ambiente de incertezas sem precedentes, avalia Marcelo
Nantes, gestor de renda variável do ASA. Segundo ele, se antes os EUA eram um país em que era possível traçar cenários, a guerra comercial rompeu esse padrão.

“O que Trump conseguiu fazer nos últimos 30 dias é colocar uma incerteza no mercado que não existia. E a incerteza é a pior coisa para o mercado”, afirma o gestor. “Já o risco é ótimo. A gente analisa, calcula, mensura e toma o risco. Esse é o nosso trabalho. A incerteza é muito ruim porque é um risco que se não consegue mensurar.”

Outras ações ligadas a commodities também registraram fortes perdas no pregão de ontem. Os papéis ordinários e preferenciais da Petrobras caíram 3,20% e 3,56%, respectivamente. Com isso, o valor de mercado da estatal recuou para R$ 430,9 bilhões – uma queda de R$ 75,5 bilhões desde o anúncio das tarifas americanas. Entre as maiores desvalorizações do dia, destacaram-se CSN ON, que caíram 5,70%; Braskem PNA, com queda de 5,62%; e Usiminas PNA, que recuaram 4,66%.

Diante da escalada da guerra comercial entre EUA e China, o gestor do ASA reduziu a exposição em Vale e Petrobras, prevendo impactos diretos sobre empresas de commodities. A estratégia da casa tem sido manter uma carteira mais defensiva, priorizando ações de concessionárias e energia, como Eletrobras, Copel, Sabesp e Equatorial, por serem menos vulneráveis ao cenário de recessão global.

Para os economistas do Citi, as tarifas comerciais podem reduzir o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 1 a 2 pontos percentuais nos próximos quatro trimestres. Para os demais países, o impacto seria cerca de metade desse valor.

Apesar de boa parte do mercado ainda considerar exagerada a chance de recessão, cresce a preocupação com uma desaceleração econômica
mais acentuada. Segundo o Goldman Sachs, o atual “bear market” pode facilmente evoluir para um ciclo mais duradouro, dado o crescente risco
de recessão na economia americana, cuja probabilidade foi recentemente elevada para 45% pelo banco.

Participação de Maurício Valadares, sócio da NAU Capital, em reportagem no Valor Econômico. Link da matéria a seguir:

Gostou? Compartilhe

LinkedIn
Facebook
Twitter
WhatsApp
Email
Rolar para cima